quinta-feira, 13 de novembro de 2008
O revólver do almirante (Sebastião Nery - Tribuna da Imprensa)
A porta abriu e lá de dentro uma voz esganiçada gritou: "Entre"! Felipe entrou. Não viu ninguém. Atrás da porta, um homem baixinho, fardado, apontava um revólver para as costas dele:
- Sente-se ali. Por que chegou antes, se a entrevista é às 12 horas?
Felipe não sabia se dava uma risada ou ia embora. Daí a pouco, fomos chegando nós, outros jornalistas, para a entrevista coletiva do almirante Penna Botto, presidente da Cruzada Brasileira Anticomunista, que foi a Minas fazer campanha contra a posse de Juscelino e João Goulart na presidência da República, eleitos dias antes, em 3 de outubro de 55.
Penna Boto
Logo no dia 5, Penna Boto tinha dado entrevista ao "Globo":
"É indispensável impedir que Juscelino e Goulart tomem posse dos cargos para que foram indevidamente eleitos".
A entrevista a nós foi uma palhaçada. O atarracado almirante queria nos convencer de que o Partido Comunista estava criando um "soviet" no Triângulo Mineiro, que iria instalar-se logo que JK tomasse posse.
Não houve "soviet", mas por pouco não houve a posse. Nas redações, passávamos madrugadas agarrados às rádios do Rio, que transmitiam a crise ininterruptamente. Até que o presidente Café Filho teve (ou fingiu) um infarto, passou o governo para o presidente da Câmara, Carlos Luz, víbora gorda do PSD mineiro, que, no dia 10 de novembro, demitiu do Ministério da Guerra o marechal Lott, vermelhão, olho azul, mais Caxias do que Caxias, e o substituiu pelo general udenista-golpista Fiúza de Castro, numa ação articulada para impedir a posse de Juscelino e Jango.
Juscelino
De madrugada, Lott e Denis, comandante do 1º Exército, fizeram o "11 de novembro" (terça fez 53 anos), "retorno aos quadros constitucionais vigentes": puseram os tanques na rua, a Câmara votou o impeachment de Carlos Luz e entregou o governo ao presidente do Senado, Nereu Ramos.
Em Minas, quando a noticia chegou ao amanhecer, corremos para o Palácio da Liberdade. Juscelino, presidente eleito, já estava lá, trancado com seu vice, o governador Clovis Salgado, e o comandante da região, general Jaime de Almeida. Os dois tentaram de todo jeito segurar Juscelino, mas ele resolveu ir de qualquer forma para o Rio. Abre-se a porta e ele sai:
- Bom-dia, vocês já aqui? Vou agora mesmo para o Rio.
- Mas, presidente, há notícias de que a Aeronáutica está ao lado de Carlos Luz, que foi para Santos com Lacerda no "Tamandaré", comandado pelo Penna Boto, e o brigadeiro Eduardo Gomes já chegou lá para tentar a resistência com a cobertura do governador Jânio Quadros. Como é que o senhor vai descer no Santos Dumont ou no Galeão? Derrubam o avião.
- Já discutimos tudo, eu, o governador e o general. Eles estão contra, mas a decisão é minha e já a tomei. Vou a qualquer risco.
Carlos Luz
Entrou em um carro e disparou para o aeroporto. Fomos atrás, repórteres e fotógrafos. Lá, uma cena dramática. Juscelino dava ordens, aos gritos, a João Milton Prates e outro piloto, queridos amigos seus, para levantarem vôo em um pequeno avião particular. Mas havia uma ordem definitiva da Aeronáutica: ninguém podia decolar.
Impedido, encostou os dois cotovelos no balcão do aeroporto, cobriu o rosto com as mãos trêmulas e chorou de sacudir. Era o choro da audácia impotente: "Meu Deus, isso não pode acontecer. Preciso assumir"!
Foi no dia seguinte. Em 31 de janeiro, o presidente era JK. Assumiu, mas só depois de Café Filho sumir, também empichado. O cruzador "Tamandaré", comandado pelo pequenininho Penna Boto, levou três tiros de festim do Forte de Copacabana e seguiu para São Paulo, onde Jânio não quis nada com eles e voltou de rabo (popa e proa) entre as pernas.
Lacerda foi direto para a embaixada de Cuba, asilado pelo ditador Fulgencio Batista. A tentativa de golpe não conseguira apagar os milhões de votos de Juscelino. Mais uma vez o golpe de 50, 54 e 55 fora adiado para 64. Terça, "O Globo" informava que "o Instituto Histórico e Geográfico homenageou (sic) o almirante Penna Boto pelos 53 anos do bombardeio (sic) sofrido pelo cruzador Tamandaré, em 55, ao tentar sair da Baía de Guanabara".
Galeonata
O governador itinerante Sergio Cabral continua insistindo em "vender" o aeroporto Tom Jobim, o Galeão. Ninguém sabe ainda qual é a "carga" dessa decolagem. Mas o presidente da Infraero, Sergio Gaudenzi, em almoço com jornalistas, segunda-feira, no Santos Dumont, abriu o jogo:
- O Brasil tem mais de 60 aeroportos. Só 10 dão lucro: Congonhas, Santos Dumont, Guarulhos, Campinas, Confins, Manaus, Salvador, Recife, Fortaleza, Porto Alegre. Os demais são deficitários. Mas o País precisa de aeroportos de norte a sul, por necessidade de comunicação e de segurança nacional. Quem vai querer os deficitários? Quem vai ficar com Tefé?
Já avisei ao ministro Jobim. Sou a favor de abrir o capital da Infraero até 49%, como a Petrobras. Mas, se quiserem privatizar, vender, chamem outro.
Sebastião Nery
domingo, 17 de fevereiro de 2008
Para Ciro, JK ganha nota dez; Lula leva sete, e Itamar, oito
KENNEDY ALENCAR
Colunista da Folha Online
Presidenciável do PSB dá notas a governos Collor, Itamar, Sarney, FHC e Lula. Na terceira e última parte da entrevista, ela fala de petistas Dilma Rousseff, ministra da Casa Civil, e de Marta Suplicy, titular da pasta do Turismo, e dos tucanos e governadores José Serra (SP) e Aécio Neves (MG).
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FOLHA - De zero a dez, que nota o sr. dá aos seguintes governos? Collor.
CIRO - Dois.
FOLHA - Sarney.
CIRO - Sarney tem uma contradição. A obra política dá a ele direito a uma nota muita alta. Eu diria 8. O desmantelo econômico e a vassalagem ao PMDB, nota dois. Oito mais dois, dez. Nota cinco. Só analiso o governo Sarney com esse critério.
FOLHA - Itamar.
CIRO - Nota oito. Não há nada que não tenha sido positivo. Houve crescimento econômico, emprego.
FOLHA - Por que não dez?
CIRO - Porque tinha problemas. Nota dez é difícil num governo. Nota dez eu vou dar para o Juscelino Kubitschek.
FOLHA - FHC.
CIRO - Quatro.
FOLHA - Lula.
CIRO - Sete.
FOLHA - Uma palavra ou definição sobre as seguintes personalidades: Getúlio Vargas.
CIRO - O conjunto da obra é uma das mais importantes intervenções de uma personalidade na vida do país. Devemos a ele a concepção do Brasil industrializado, moderno. Mas quando cedeu à tentação da ditadura, aconteceram coisas em seu governo impossíveis de serem contemporizadas a qualquer tempo que tenham acontecido.
FOLHA - Juscelino Kubitschek.
CIRO - O maior de todos.
FOLHA - Collor.
CIRO - Um equívoco.
FOLHA - FHC.
CIRO - Palavra muito forte veio aqui, mas, como agora sou um cara mais sereno, diria que foi uma grande frustração.
FOLHA - Lula.
CIRO - Uma grande surpresa.
FOLHA - Dilma.
CIRO - Extraordinária.
FOLHA - Marta.
CIRO - Uma mulher de valor.
FOLHA - Serra.
CIRO - Um homem de valor, porém, sem escrúpulos.
FOLHA - Aécio.
CIRO - O mais interessante jovem quadro da democracia brasileira.
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Kennedy Alencar, 40, é colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve para Pensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre os bastidores da política federal, aos domingos. E-mail: kalencar@folhasp.com.br |